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Artigo em Jornal relembra histórico de trabalho escravo em usinas de álcool em Confresa

As usinas de álcool se tornaram presenças habituais na chamada “lista suja” do trabalho escravo do governo federal

16/11/2019 | 09:25

Repórter Brasil

Artigo em Jornal relembra histórico de trabalho escravo em usinas de álcool em Confresa

Revogação de veto que proíbe cultivo da cana na Amazônia pode abrir caminho para mais destruição da floresta e conflitos por terra.

Foto: Sérgio Carvalho.

Se em agosto os incêndios criminosos na Amazônia triplicaram, agora uma nova ameaça paira sobre a floresta: o sinal verde para o plantio de cana-de-açúcar. O governo revogou, na semana passada, um decreto que há dez anos vetava a expansão canavieira na floresta amazônica e também no Pantanal. A medida abre caminho para o cultivo da cana e, segundo pesquisadores, para mais desmatamento, queimadas e conflitos por terra. 

Ao trancar os portões da Amazônia e do Pantanal para a cana-de-açúcar, o decreto 6.961 de 2009 ajudou não apenas a manter os biomas livres dessa ameaça, mas também a valorizar o etanol brasileiro no mercado externo, já que a plantação de cana para produzi-lo não estava atrelada ao desmatamento.

Tanto que todas as vezes que a ideia de autorizar cana na Amazônia vieram à tona no passado, a indústria do etanol se posicionou contra a liberação. Como aconteceu em março de 2018 durante a discussão do PLS 626/2011, do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), que autorizava canaviais nos dois biomas. A União da Indústria de Cana de Açúcar (UNICA) criticou o projeto, alegando que ele mancharia a reputação do etanol brasileiro e colocaria em risco os mercados internacionais já conquistados. 

A revogação do decreto, portanto, pode gerar graves impactos ambientais, segundo os especialistas. Pode também causar prejuízo na comercialização da cana e do açúcar brasileiro no mercado internacional, já que o cultivo na Amazônia afasta compradores internacionais. Além disso, o avanço para essas áreas também seria desnecessário, pois o país já conta com uma ampla área degradada agricultável, suficiente para expandir a produção. 

Há dez anos uma investigação da Repórter Brasil feita na época em que o zoneamento foi promulgado mostrava o interesse do setor em implementar usinas na região do Pantanal e entorno, na Bacia do Alto Paraguai e na Amazônia.

As usinas já existentes na Amazônia e Pantanal, inclusive, carregam um pesado histórico de situações de trabalho análogo à escravidão, por variados motivos, entre eles a vastidão do território e as dificuldades de fiscalização. É o caso de usinas como a Gameleira (posteriormente Destilaria Araguaia), em Confresa (MT), e a Alcopan, de Poconé (MT), que se tornaram presenças habituais na chamada “lista suja” do trabalho escravo do governo federal. 

Alcoopan em Poconé: 

Em 2005, pelo menos 400 pessoas foram resgatadas da usina Alcopan – Álcool do Pantanal Ltda, localizada em Poconé, a 100 quilômetros de Cuiabá, em ação da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) do Mato Grosso. “Pelas características encontradas aqui, verificamos que se trata de uma condição análoga à de escravo, de acordo com a legislação”, afirmou o auditor fiscal da DRT Valdiney Antônio de Arruda.

Os trabalhadores estavam em atividades que iam do corte da cana até a organização do almoxarifado da usina. A maioria veio do Maranhão, Alagoas, Pernambuco e Piauí – estados com altas taxas de desemprego e baixos índices de desenvolvimento humano. Os gatos que atuavam na contratação de mão-de-obra ofereciam pelas rádios dos municípios dos aliciados um emprego com alimentação farta e boa moradia, assistência médica e equipamentos de proteção – tudo gratuitamente. Além de um salário que chegava a R$ 1.200,00.

Sem dinheiro:

Na época os proprietários da usina afirmaram para a DRT e os trabalhadores que não tinham recursos para quitar as dívidas. A Alcopan moeu 420 mil toneladas de cana plantadas em 6.200 hectares, produzindo 38 milhões de litros de álcool na safra 2002/2003.

Além do aliciamento com promessas falsas, das condições degradantes e da falta de pagamento, outro importante fator que configurou o trabalho escravo foi o cerceamento de liberdade. Os trabalhadores da Alcopan foram impedidos de voltar para casa, pois não tinham dinheiro para empreender a viagem de volta para o Nordeste. Apenas de salários não pagos na época foram mais de R$ 350 mil, sem contar direitos trabalhistas e descontos indevidos.

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