A Assembleia Legislativa de Mato Grosso aprovou, por unanimidade, o projeto de lei que estabelece critérios técnicos para a definição de áreas úmidas e regulamenta atividades econômicas nos vales do Araguaia e do Guaporé. O texto aprovado deve ser encaminhado para sanção do governador Mauro Mendes (União), e sua aplicação dependerá de regulamentação pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema).
A proposta é resultado de um impasse que se arrastava desde 2008 em torno do Zoneamento Socioeconômico Ecológico (ZSEE), elaborado pela Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag). O zoneamento previa a classificação de grandes porções de território como áreas alagáveis — similares ao Pantanal — o que restringia a exploração econômica em mais de quatro milhões de hectares.
A medida afetava diretamente 17 municípios do Araguaia: Cocalinho, Nova Nazaré, Água Boa, Novo Santo Antônio, São Félix do Araguaia, Luciara, Canarana, Porto Alegre do Norte, Santa Terezinha, Nova Xavantina, Confresa, Vila Rica, Ribeirão Cascalheira, Serra Nova Dourada, Araguaiana, Bom Jesus do Araguaia e Canabrava do Norte. Cocalinho, a 923 km de Cuiabá, estava entre os mais impactados.
Diante das divergências, a Seplag anunciou a realização de uma consulta pública virtual, o que foi contestado por produtores rurais sob o argumento de que grande parte das comunidades locais não tinha acesso à internet. O impasse levou o caso ao Núcleo de Conciliação do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, que determinou a elaboração de um laudo técnico-científico capaz de delimitar, com precisão, as áreas consideradas úmidas.
A Assembleia Legislativa contratou a Fundação Uniselva, vinculada à Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), para a realização do estudo. Com base no laudo, foi formulado o projeto de lei de autoria do deputado Dr. Eugênio (PSB) e coautoria de Valmir Moretto (Republicanos). A aprovação unânime no plenário foi considerada um desfecho para o impasse.
Durante a tramitação, parlamentares mantiveram diálogo com o governador Mauro Mendes, que se manifestou favorável à proposta. Após a sanção, caberá ao Consema estabelecer as normas de aplicação da nova legislação.
A discussão sobre o ZSEE teve início nos anos 2000, quando o Governo Federal estimulou os estados a elaborarem zoneamentos socioeconômicos e ecológicos. Mato Grosso concluiu seu modelo em 2008, com aprovação legislativa em 2011. Entretanto, uma ação do Ministério Público Estadual contestou o processo, o que atrasou a implementação por vários anos.
Em gestões posteriores, o tema passou por diferentes conduções: sob o governo de Pedro Taques, o zoneamento foi reavaliado por técnicos da Sema e da Seplag, mas permaneceu sem avanço até ser retomado em 2021 pela atual administração.
O secretário de Planejamento, Basílio Bezerra, e a secretária de Meio Ambiente, Mauren Lazzaretti, conduziram a atualização do projeto, enfrentando resistência de segmentos do setor produtivo. A mobilização ganhou força com a atuação de entidades locais, como a Associação dos Fazendeiros do Vale dos Rios Araguaia, Cristalino e das Mortes (Afava), presidida pela médica e pecuarista Carmem Bruder, e lideranças políticas regionais como o deputado Dr. Eugênio, de Água Boa, e o médico André Bringsken (MDB), de Vila Bela da Santíssima Trindade.
Com a aprovação do novo texto, o Estado de Mato Grosso define parâmetros científicos e legais para a classificação de áreas úmidas, conciliando preservação ambiental e segurança jurídica às atividades econômicas desenvolvidas na região.